Acúmulo de lixo na orla do Lago Paranoá atrai ratos e escorpiões
Aumento no número de pessoas que buscam lazer às margens do espelho-d’água não foi acompanhado de ações para minimizar impacto ambiental
atualizado
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A abertura da orla do Lago Paranoá entregou à população do Distrito Federal um novo espaço de lazer, tornado público em processo cheio de idas e vindas judiciais concluído no início de 2018. No entanto, com um número cada vez maior de frequentadores, a falta de conscientização de alguns sobre o destino dado ao lixo deixado às margens do espelho-d’água tem preocupado moradores e pessoas que visitam o local.
As discussões sobre a orla se intensificaram ao ponto de a Vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do Distrito Federal marcar, para 15 de março, audiência pública destinada a debater o uso e ocupação do espaço.
Nos fins de semana e feriados, é comum a reunião de grupos e a promoção de festas com bebidas alcoólicas e churrasco na orla, sobretudo no Parque Asa Delta e na reserva da Península dos Ministros, no Lago Sul. Mesmo quando as pessoas fazem a coleta do lixo ao final dos eventos, a falta de lixeiras suficientes favorece a proliferação de animais vetores de doenças, que raramente eram encontrados.
Moradores da região relatam o aparecimento de ratos, pombos, baratas e escorpiões na beira do lago. Além disso, há a preocupação com as capivaras, hospedeiras do carrapato-estrela, que transmite uma doença às vezes fatal para humanos: a febre maculosa.
Outro problema é que, em alguns locais, como o Parque da Península dos Ministros, o estacionamento público tem poucas vagas. Dessa forma, frequentadores deixam os veículos na rua estreita de dois sentidos que dá o ao Lago Paranoá pela QL 12.
Sem espaço, muitos estacionam nas calçadas e em frente à garagem das casas. O Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF) demarcou a área proibida, mas é comum que fiscais do órgão sejam chamados para guinchar automóveis bloqueando entradas de residências.
Para a decoradora Valéria Leão, moradora da QL 12, falta estrutura para o visitante. “Fizeram o parque e não deram equipamentos básicos para os frequentadores. Acho que todo mundo tem o direito de usar, sim, mas esses problemas estão levando vários animais para os arredores. É muito agradável ear pela orla, andar de bicicleta, mas não se pode deixar as pessoas entrarem em uma reserva ambiental com churrasqueiras e caixas de bebidas alcoólicas”, afirma.
O engenheiro civil Dario Clementino, presidente da Associação de Moradores da QL 12, sugere a adoção de regras semelhantes às de outros parques ecológicos de Brasília para os espaços à beira-lago. “Nós temos mantido contato com o GDF [Governo do Distrito Federal] e a istração Regional do Lago Sul, e os órgãos querem colocar guarita com vigia nos os. Outra medida é adotar horário de abertura e fechamento”, diz.
Segundo o presidente da entidade, é preciso também dar uma solução definitiva ao problema de falta de estacionamento, que provoca transtornos aos moradores da região. “Sábado e domingo, a gente não tem como receber visitas, porque não há onde a pessoa estacionar. Tem vizinho que coloca o carro praticamente dentro da casa da pessoa, em rotatórias feitas para veículos manobrarem. Isso quando não param bloqueando a garagem”, reclama Clementino.
O Metrópoles questionou o Instituto Brasília Ambiental (Ibram), responsável por gerir os parques do DF, sobre as providências a serem tomadas acerca dos problemas apontados pelos moradores, mas não obteve resposta do órgão até a última atualização desta reportagem.
Por meio de nota, a istração Regional do Lago Sul informou que há previsão da construção de guaritas e atuação de vigilância, “para garantir equilíbrio entre o uso do espaço público e a preservação ambiental”. Segundo o órgão, o o aos parques Península e Asa Delta já serão regularizados neste fim de semana e o portão que vinha sendo usado de forma irregular na QL 12 ficará fechado aos sábados e domingos, ficando permitida a entrada apenas pelos portões principais.
“Serão desenvolvidas ações para educação ambiental dos frequentadores dos parques, que precisam estar conscientes da responsabilidade, que é de todos, de preservar o Lago Paranoá e toda área que o margeia”, finaliza a nota.
Audiência pública
Os problemas decorrentes do aumento no número de frequentadores das margens do espelho-d’água chegaram à Justiça e a Vara de Meio Ambiente promove, em 15 de março, audiência pública. O encontro foi agendado devido a uma ação popular questionando a execução de obras no local, onde ciclovias foram construídas dentro de áreas de preservação permanente, violando regra ambiental que proíbe retirada de vegetação a menos de 30 metros da margem do lago.
A utilização do uso da orla do Lago Paranoá decorre de acordo de desocupação firmado entre o GDF e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), homologado pela Vara Ambiental. Com o questionamento, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) decidiu ouvir moradores, governo, associações interessadas ou qualquer pessoa que queira cooperar com a discussão pública sobre o uso adequado e sustentável do espaço.
Estudos de viabilidade
A polêmica em torno da desobstrução da orla do Lago Paranoá voltou à pauta após o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), criticar a liberação do espaço, no último dia 12. Na ocasião, o emedebista disse que “não pode ter gente circulando, porque traz sujeira”. Ele anunciou que serão feitos estudos de viabilidade de implantação de parques vivenciais para que a população tenha o de forma controlada, sem ocasionar poluição no local.
O pronunciamento do governador também causou alvoroço nas redes sociais e dividiu moradores da cidade. Na época, o coordenador do movimento Ocupe o Lago, Marcelo Ottoni, diz ter se surpreendido com a visão de Ibaneis sobre o Lago Paranoá. “A solução não é fechar, e sim transformar esses lugares, levando ordenamento, limpeza e segurança”, sugeriu.
Áreas abandonadas
Em setembro de 2018, o Metrópoles mostrou a situação da orla do Paranoá. Em muitos lugares, as áreas ficaram abandonadas após arem por desobstrução. Em agosto de 2015, a istração anterior iniciou o processo de remoção das estruturas. O trabalho foi finalizado em janeiro de 2018, com saldo de 1,7 milhão de metros quadrados desobstruídos, num total de 454 lotes recuados.
No entanto, a velocidade com que os tratores da Agência de Fiscalização (Agefis) derrubaram edificações situadas a menos de 30 metros da margem do lago não foi a mesma para revitalizá-las. Na QL 28, por exemplo, na altura do Conjunto 4, após a retirada das cercas, o que ficou foi um amontoado de ferros contorcidos e pedaços de concreto pelo chão.
Os moradores do local ainda esperam as melhorias. Alguns, cansados das promessas, decidiram por conta própria refazer o paisagismo na área pública.
Na parte norte do Paranoá, as áreas desobstruídas da orla não foram as únicas deixadas de lado pelo poder público. De embarcações, é possível observar margens totalmente degradadas e com entradas de difícil o. Desde então, moradores aguardam ações do Estado para levar infraestrutura e segurança a essas localidades.